Grafite também é arte de mulher!
- Ingrid Abage
- 1 de dez. de 2015
- 5 min de leitura
“As mulheres hoje em dia buscam voz e fazem por onde serem ouvidas e respeitadas nesse meio”
O grafite ou graffiti palavra de origem italiana “graffito”, usada para designar os desenhos de épocas passadas feitos em paredes. É uma manifestação artística feita principalmente em locais públicos, podendo ser exposto em formas de desenhos, escritas, símbolos, caricaturas, etc. Consiste em transformar muros em obras de arte, modificar o cenário urbano da região em uma exposição artística. Pelo fato de estar presente no cotidiano e ter características marcantes, as mulheres vem utilizando essa arte para lutar cada vez mais pelo seu espaço e mostrar que devem ser respeitadas como artistas acima de tudo.
O grafite tem sido usado como uma ferramenta na luta contra o machismo e o sexismo presente nos grupos de arte de rua. Não é raro, para não dizer impossível, encontrar alguma grafiteira que não tenha sofrido algum tipo preconceito pelo simples fato de ser mulher e principalmente quando são recém-chegadas nesse universo. Segundo a estudante e grafiteira Laís Alves, logo no começo da sua jornada, ela foi vítima do machismo. “Eu fui hostilizada, de ficarem falando – Ah, por que tu trouxe essa menina?! Tá perdendo seu tempo, gastando tinta à toa (...) Rolou sim preconceito da parte deles e eu acho que até hoje em dia rola. Tem muitos caras que apesar de não falarem, eu sinto que eles acham que mulher não se garante tanto feito homem ”

Devido ao constante comportamento dessa natureza, as pichações e grafites de cunho político têm sido a voz das mulheres nas ruas, que protestam contra o modo como são tratadas cotidianamente lançando uma onda de empoderamento e sororidade entre as mulheres, o que infelizmente não é uma tarefa fácil. Para a educadora social do Recife, Rebecca França, que também grafita, a participação feminina é crescente em vários aspectos nessa década, porém o machismo continua presente. “O discurso feminista se expande e naturalmente as mulheres da nova geração vão acreditando que podem fazer qualquer coisa. Os caras por sua vez continuam hiper sexistas. Eu sofro preconceito de gênero sempre. Sou formada em história e dou aula, os alunos me respeitam menos por que sou mulher! Faço pixe e as vezes um ou outro grafite as pessoas ficam chocadas (positiva e negativamente) porque sou mulher. Os grafiteiros acham que só estou ali por que sigo meu companheiro, o contrário nunca! Nos eventos que fazemos todo mundo se dirige aos homens da equipe nunca as mulheres.... Os exemplos são infinitos...”
Coletivos e grupos de grafite, mais conhecidos como “crews”, têm se dedicado a transmitir a filosofia feminista e educar crianças e jovens por meio da arte. Exemplos desses coletivos que atuam em Pernambuco são o Pixegirls (Região Metropolitana do Recife) e o coletivo Cores do Amanhã (Recife-PE). Para as meninas do Pixegirls o objetivo é trazer o empoderamento feminino através da arte, segundo a grafiteira Laís Alves, uma das fundadoras do Pixegirls, o coletivo prega a ideologia do feminismo, da luta contra o machismo, homofobia, racismo e desigualdade social. Já o Cores do Amanhã, localizado na Rua Garota de Ipanema Box 02 – A, Totó, Recife -PE, funciona como um projeto social e cultural que tem como objetivo ser uma referência na prática de ações de educação informal através da cultura dentro do estado de Pernambuco.

Para a grafiteira Irene Késsia, popularmente conhecida como Neni’s e integrante do coletivo Cores do Amanhã, o grupo tem como base os elementos do hip-hop, entre eles, a dança, o grafite e o rap. Tem como fonte de sustento o grafite e faz uma atividade voltada para as comunidades. O coletivo também realiza um trabalho só com mulheres, o Cores Femininas, que tem como base unir as mulheres de várias áreas do estado.

Graças a projetos e coletivos como é esse é possível notar um grande número de mulheres grafitando, porém, por mais que seja notável esse aumento presente no universo artístico, isso não significa que o preconceito de gênero e a descriminação estão acabando. A grafiteira Neni’s conclui que “O que aumentou foi a exposição delas, tanto na mídia quanto nos meios do hip hop. As mulheres hoje em dia buscam voz e fazem por onde serem ouvidas e respeitadas nesse meio”
Contexto Histórico
O grafite surge na Idade Contemporânea na década de 70, em Nova Iorque, nos Estados Unidos com marcas nas paredes da cidade deixada por jovens, nessa mesma época o grafite já aderia adeptos no Brasil.
Por ser considerado uma arte de rua, movimento de cultura e resistência, o grafite está ligado diretamente a vários outros movimentos de raízes periféricas que também floresceram nas ruas, um exemplo disso são os grupos de break e rap que derivam do hip-hop. Esses movimentos têm em comum o fato de ser usar a arte como um instrumento político e como forma de protesto contra a opressão que vivem.
Muitos estudiosos defendem o grafite como arte, por imprimir seus desejos e mensagem através de símbolos e sinais em diferentes variações estéticas, mas o grafite nem sempre foi considerado arte e sempre ocorria de as pessoas confundirem o grafite com a pichação.
Mas afinal, qual é a diferença?
A pichação consiste em escrever ou rabiscar muros, fachadas, edifícios, asfalto ou monumentos usando tinta em spray aerossol, dificilmente removível, ou mesmo rolo de tinta. Geralmente são escritas frases de protesto, insulto, assinaturas pessoais ou mesmo declarações de amor, embora a forma mais comum de pichação seja utilizada como forma de demarcação de territórios entre grupos. A pichação é no Brasil considerada um crime de vandalismo e segundo o artigo 65 da lei dos crimes ambientais, 9.605/98, a punição para quem é pego pichando varia de três meses a um ano de cadeia e pagamento de multa.

Para a grafiteira e letróloga, Thábata Marques, mais conhecida como Tab, não existe tanto essa diferença entre grafite e pichação, “é mais a diferença do próprio sistema de ver aquilo alí como coisas diferentes. Eu acho que o pixo ele é muito mais agressivo, com um teor político muito mais forte, de você conseguir chocar (...) Dentro da arte a gente vê como coisas tão parecidas, tão próximas e as pessoas de fora veem que só o grafite é bonito, grafite é legal e a pichação é uma coisa feia, uma coisa de marginal, e é, só que o conceito de marginal que a gente tem é esse, a gente tá a margem do capitalismo. ”
Tipos de Grafite
O grafite possui diversas vertentes artísticas, uma delas é o 3D, onde os desenhos são criados a partir de ideias visuais de profundidade, sem contornos. Essa técnica exige um grande domínio técnico do grafiteiro na combinação de cores e formas.

Uma das modalidades mais comuns é o bomber, que são letras maiores e gordas, que parecem vivas, geralmente feitas com duas ou três cores.

E tem o grafite como projeto social, onde os artistas são convidados a para fazer um trabalho que visa o embelezamento da cidade. Com isso, espera-se que as pessoas interessadas nessa atividade possam continuar expressando sua arte, mas sem causar prejuízos ao planejamento urbano. Um exemplo dessa modalidade é o projeto Pimp my Carroça, que é um movimento que acontece em várias cidades do país, sendo Recife uma delas. Essa iniciativa busca tirar os catadores de materiais recicláveis da invisibilidade, proporcionando a eles autoestima, além de sensibilizar a sociedade com ações que utilizam o grafite como ferramenta de conscientização.

É só olhar em volta, Recife é tomado pela arte, nas ruas são estão gravadas desde palavras de ordem até aqueles desenhos que não sabemos muito bem o que significa. As assinaturas de mulheres se fazem mais presentes, mostrando que mesmo com todas as dificuldades e o preconceito sofrido, elas estão tomando as ruas. É muito bonito e revigorante ver a satisfação que o grafite traz para essas mulheres, segundo a grafiteira Thábata Marques, fazer com que a pessoa pare e pense sobre a mensagem que ela quer passar é o que a faz ter mais estímulo para continuar grafitando. É algo tão simples, mas de grande importância.
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